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Por Marsal Alves y Cristiano
Pereira
Número
53
Resumo:
Esse artigo tem como objetivo aprofundar a discussão
sobre uma abordagem metodológica para
o estudo de videogames. Atualmente o campo de
discussão encontra-se polarizado entre
narratologia e ludologia. Atualizando o debate
iniciado no artigo “Entre combos e Enigmas”
pretende-se demonstrar um caminho para estabelecer
uma forma de análise dos jogos de videogame
que hoje, a complexidade do jogo vai para além
da sua tecnologia, tornando-os assim complexos
em seus aspectos de comunicação
como produto de mídia e entretenimento.
Resumen:
Este artículo tiene como objetivo profundizar
la discussion acerca de la metodologia para el
estudio de los videojuegos. Las reuniones del
campo de la pelea polarizaron actualmente entre
el narratologia y el ludologia. El traer actualizado
el discusión iniciado en el artículo
“entre los combos y los enigmas”
se piensa para demostrar una manera de establecer
una forma de análisis de los juegos del
videojuego a que hoy, la complejidad del juego
así más allá de su tecnología,
convirtiéndose en ellos complejos en sus
aspectos de la comunicación como producto
de medios y de la diversión.
Anteriormente
defendemos a importância da construção
de uma tipologia dos games cujos conceitos -além
de sua
transparência-, forneçam ferramentas
adequadas para a análise de seus discursos.
Em contrapartida, apontamos os problemas estruturais
de uma tipologia de mercado que se apresenta
como resultado das estratégias de marketing
das distribuidoras. Bem entendido, não
se quer condenar tal tipologia –fundamental
na hora do gamer escolher seus jogos-,
apenas alertar para o fato de que assumi-la tal
como apresentada não nos fornece subsídios
na construção de uma metodologia
de análise que possa lidar com a diversidade
e com a especificidade dessa narrativa.
Não é
o caso, então, de jogar fora o que as
tipologias de mercado nos apresentam. Pelo contrário,
suas categorias ou mesmo os modos pelos quais
se organizam nos fornecem uma série de
pistas na descoberta de características
dessa mídia. Operacionais ou não,
destacam aspectos dos games importantes
o suficiente para se proporem como pontos de
referência na interface produto/gamer.
Encontramos
hoje nas discussões sobre games
algumas perspectivas já estabelecidas
no que diz respeito aos modos de operação
dos jogos. Esse horizonte metodológico
está mais ou menos estruturado em torno
de um eixo que se articula entre os conceitos
de narratologia e ludologia.
Linhas
de análise dos games
Narratologia
No que diz respeito à narratologia, é
interessante notar como o fortalecimento da tomada
de posição em direção
à narrativa parece estar intimamente ligado
ao desenvolvimento da indústria dos games.
Em seus primeiros anos, especialmente na primeira
década, os jogos eram feitos por programadores
cujo principal interesse não parecia estar
nos aspectos narrativos. As histórias
dos jogos eram como roupagens que “embrulhavam”
o produto: dava-se o nome de nave para aquele
pontinho azul, enquanto que, na caixa do jogo,
dizia-se que os inimigos (outros pontinhos azuis)
eram “os terríveis zarkonianos”.
E isso era tudo o que se oferecia ao gamer antes
de ligar o console e sair “atirando”.
Algumas décadas se passaram desde então.
A valorização da narrativa veio
juntamente com o aparecimento de jogos que propunham
tramas mais complexas, personagens mais ricos
e cenários impossíveis para as
gerações tecnológicas anteriores.
Juntos, esses elementos buscam imergir o gamer
dentro do universo proposto, seduzindo-o. Um
processo a um só tempo específico,
mas também similar ao de outras mídias
dentro da indústria do entretenimento.
É a narrativa
que articula e organiza o material proposto,
determinando não apenas como as histórias
serão contadas, mas sobretudo atuando
na constituição de gêneros
narrativos mais ou menos definidos. Para os narratólogos,
os games representam uma maneira particular
de expressar uma história, da mesma forma
que o cinema, os quadrinhos, a tv ou a literatura.
Ao estudioso cabe então a tarefa de dar
conta de suas especificidades. Diante dessa perspectiva,
uma tipologia de games estaria vinculada, como
no cinema ou nos quadrinhos, ao gênero
narrativo. Teríamos jogos de ação,
de guerra, de terror, westerns, comédias,
etc. O critério é o que o tipo
de coisas que se contam no jogo. A narrativa
é a dimensão que sobredetermina
todas as outras.
Ludologia
A ludologia corporifica uma linha de pensamento
que inverte a posição central atribuída
à narrativa. Antes determinante, agora
ela é colocada em subordinação
a um sistema condutor de regras de interação.
O que subjaz à idéia de ludologia
é que não é preciso haver
uma história. Para que o jogo funcione
enquanto jogo, basta que proporcione uma estrutura
reconhecível ao qual o gamer
possa adaptar-se. Para Jesper Jull, um dos ludólogos
mais conhecidos, o jogo pode ser apenas o jogo
pelo jogo.
Este tipo de
argumentação nos leva à
desvalorização da história
frente à estrutura lúdica. A análise
do ludólogo baseia-se nas relações
estabelecidas pelos objetos/funções
do jogo e não pelo que remetem enquanto
significação. Ao ludólogo,
não é importante que o jogo remeta
a nada externo que lhe seja externo. O jogo já
não precisa significar algo, mas ser algo.
O objetos do jogo estariam ali para cumprir funções
específicas dentro do sistema oferecido,
e não precisam, necessariamente, remeter
às coisas do mundo. Não importa
se o pontinho azul é uma nave ou se o
inimigo é nazista ou aliado. O que importa
é que o gamer reconheça
uma estrutura e saiba como agir em função
dela. Uma tipologia feita a partir do viés
ludológico vai em direção
a um entendimento algoritimico do jogo. Um exemplo
bastante prático disso é apresentado
por Koster, falando de um jogo clássico
da cultura dos games: Tetris.
Let’s
try a thought experiment. Let’s picture
a mass murder game where in there is a gas chamber
shaped lide a well. You the player are dropping
innocent victims down into the gas chamber,
and they come in all shapes and sizes…they
grab onto each other and try to form humam pyramids
to get to the top… It is Tetris (Koster,
p. 168. 2005).
A idéia
é a de que não importa o que esse
sistema representa: os blocos de Tetris podem
remeter tanto ao holocausto, à melancias
caindo dentro da carroça ou à coisa
nenhuma. A narrativa é subordinada à
estrutura de jogo. No caso de Tetris, aliás,
parece ser totalmente dispensável.
Isso não
quer dizer que a ludologia exclua, necessariamente,
a narrativa. Apenas que é o sistema ludológico
e não a narrativa que vai determinar as
principais decisões na construção
do jogo.
Narratologia/Ludologia
Existe uma terceira linha que busca de alguma
forma unificar as duas abordagens anteriores.
Essa linha, representada principalmente pelos
estudos de Gonzalo Frasca, professor pesquisador
de games do Instituto de Copenhagem, defende
em seus artigos uma aproximação
da narratologia com a ludologia. Seus argumentos
relacionam o sistema de jogo e a história
como constituintes de um modelo específico
de narrativa, que abrange os movimentos e conceitos
da ludologia. Defende a idéia de que o
jogo tem uma narrativa, e que essa é o
resultado da ação das relações
entre o sistema ludológico estrutural
do jogo e os elementos da narrativa. Essa descrição
do jogo por Frasca aponta para uma perspectiva
de definição do jogo como produto
narrativo, assim como os livros ou o cinema.
Diferente, porém, pela sua peculiaridade
essencial enquanto sistema lúdico.
Narrativa e
sistema ludológico constituem partes indissociáveis
das características dos games.
Se pegamos, por exemplo, um jogo como The
Secret of Monkey Island1,
fica evidente essa dificuldade de separar os
dois conceitos: será impossível
resolver os puzzles propostos sem que o jogador
se tenha embuído da história que
está sendo proposta e perceba o que lhe
pede a narrativa em cada momento. Por outro lado,
perceber os movimentos da história não
é o suficiente se ele não consegue
avançar os puzzles que lhe proporciona
a estrutura ludológica. E são justamente
os elementos da narrativa que vão lhe
oferecer a solução para os puzzles.
Narrativa
dos games
Mas o que descreve, então, a tipologia
de um jogo?
Em um primeiro momento, nossa concepção
se aproxima daquela de Frasca: uma tipologia
dos games deve partir do relacionamento entre
os conceitos de narratologia e ludologia, de
forma a se evitar a exclusão mútua
entre jogar e narrar. Achamos, contudo que apenas
essa articulação ainda não
leva em conta algumas das especificidades fundamentais
dos jogos eletrônicos, especialmente no
que diz respeito ao papel que neles desempenham
as tecnologias.
Por isso propomos
alguns movimentos: a existência de um conceito
de narrativa específico que é formado
pela ação de três diferentes
dimensões; uma dimensão genérica,
ou de gênero narrativo propriamente dito;
uma dimensão ludológica; e uma
terceira dimensão que é a dimensão
tecnológica.
A opção
pela narrativa
Antes de entrar nos detalhes desse reposicionamento,
é útil que se faça alguns
comentários.
A opção
pela narrativa não se dá sem uma
série de considerações.
Uma delas é que é arbitrária:
além das sugestões apontadas por
narratólogos e ludólogos existem
outros critérios a partir dos quais podemos,
com alguma eficiência, classificar os games.
Pensamos, por exemplo, na tipologia de jogos
proposta por Caillois, cujas marcas são
estabelecidas a partir do tipo de operação
lúdica que é proposta pelo jogo.
Em outro sentido, poderíamos adotar um
critério tecnológico: uma classificação
a partir da geração tecnológica
ao qual cada game pertence. No primeiro,
classificamos os jogos pelas suas diferenças
de apelo: jogos de disputa, de sorte, de interpretação
ou que buscam sensações físicas.
No segundo, por suas diferenças de características
técnicas: nível de resolução,
nível de interatividade, nível
de imersão, etc. De uma forma ou outra,
todos esses critérios se inscrevem no
cerne das problemáticas dos games.
Outro ponto
importante é que, ao optar pela narrativa
como critério organizador de uma tipologia,
é possível que se entenda que adotamos
aqui a linha proposta pelos narratologistas.
Não é verdade. A narrativa, nos
moldes propostos aqui, não é a
mesma de que eles falam, uma vez que compreende
aspectos que não são operacionalizados
em seu sistema. O que pensamos como narrativa
engloba, sem dúvida, os gêneros
narrativos, mas não se resume a eles.
Conceito de
narrativa dos games
Quando falamos narrativa dos games,
falamos de um tipo específico de narrativa.
Que guarda, certamente, relações
com outras narrativas midiáticas -especialmente
o cinema e os quadrinhos-, mas que possui objetivos,
gramática e processualidades próprias.
Os games apresentam suas histórias de
maneiras que lhe são peculiares. Sem dúvida
que suas cut scenes remetem ao cinema e a construção
de seus personagens remete aos quadrinhos: mas
no instante em que o gamer -consubstanciado
através de seu avatar-, assume esta ou
aquela linha de ação e interfere
fisicamente dentro da narrativa -atualizando
uma história que reside “apenas”
em potência dentro de um suporte qualquer-,
toda a semelhança anterior deve ser colocada
em perspectiva. A narrativa em games
não se resume à história
que está sendo contada. De fato, não
se resume nem a como está sendo contada
(um narrador, um herói, linearmente, com
elipses de tempo, etc). Mas deve compreender
também as decisões de interface
que disponibiliza ao jogador, bem como os dispositivos
técnicos de que dispõe.
Narrativa é
então a articulação entre
três dimensões inseparáveis.
A primeira é o conceito de narrativa nos
moldes usados pelos narratologistas. Por uma
questão de clareza, optamos chamar esta
dimensão de gênero narrativo. Diz
respeito então aos aspectos formais dos
gêneros (aventura, comédia, ação,
terror, etc.) e dos elementos que o constituem
(a estética adotada, tipos, cenários,
tom, etc). Uma segunda dimensão é
herdada das preocupações dos ludólogos
e diz respeito às interfaces adotadas
pelo jogo. Interface aqui vista menos como estratégias
de comunicação e mais como um padrão
reconhecível de jogo. É uma descrição
do jogo em termos de seu funcionamento e não
do que significa. Uma última dimensão
refere-se ao estatuto tecnológico do jogo
que, como nas outras mídias, atua dentro
da narrativa a partir de seus limites e de suas
capacidades mas que, dentro dos games, vai desempenhar
seu papel de uma maneira muito particular, impondo
ao gênero a constante atualização
de suas estratégias de comunicação.
Gênero
Em outro artigo, vimos a dificuldade de classificar
jogos que tem uma temática específica
(jogos de guerra, fantasia ou qualquer outro
gênero importado da literatura ou cinema)
com jogos cujo apelo principal não é
da ordem do gênero (puzzles, board
games, etc). Pode-se pensar, e de fato concordamos
com isso, que aí reside um bom critério
tipológico: existem os jogos de gênero
e existem os jogos não-narrativos.
Mas tal classificação entra em
colapso quando pensamos na quantidade de jogos
que, estando dentro do mesmo gênero, são
tão diferentes que dificilmente podemos
considerá-los como pertencentes à
mesma família. Pensamos no abismo narrativo
apresentado entre jogos como Space Invaders
(um dos primeiros clássicos dos games)
e jogos como Call of Duty: quanto ao
gênero, não há dúvidas
que são, ambos, filiados à mesma
antiga linha: os jogos de guerra. Mas evidencia-se
o caráter demasiado abrangente da categoria,
que coloca na mesma gaveta dois produtos completamente
diferentes. Dito de outra forma, pode-se dizer,
talvez, que o assunto genérico é
uma das únicas coisas que tem em comum.
Misturam-se alhos e abacates e diz-se que são
o mesmo, já que vêm, afinal, da
terra.
Assim, considerar
uma tipologia dos games a partir de seu gênero
é insuficiente. É preciso acrescentar
outras características que, atuando juntamente
à primeira, vão “afinar”
as definições de categoria dos
games.
Interface
Se analisados do ponto de vista do gênero
Space Invader e Call of Duty podem ser
colocados na mesma categoria, enquanto interface
são completamente diferentes. Não
estamos falando da diferença óbvia
entre os gráficos de um e de outro (e
pensamos que a importância dos gráficos
dentro dos games assume um caráter
vital dentro das narrativas), mas porque sua
organização ludológica é
completamente diferente. Essa diferença,
que nomeamos interface, é tão importante
que vamos encontrar
-mesmo no mercado- um conjunto de nomenclaturas
próprio que remete a essa dimensão.
Apesar de ignorar as informações
genéricas, essas nomenclaturas proporcionam
ao gamer a apreensão imediata
de informações importantes sobre
o funcionamento do jogo. Diz-se de Space
Invaders um jogo de plataforma e de Call
of Duty, um jogo shooter. Junto
a estes tipos de interface, várias outras
se fazem presentes: rpgs, jogos de tabuleiro,
universo aberto, puzzles etc. Uma classificação
cujo critério independe totalmente de
seu caráter genérico, mas exclusivamente
de sua interface.
Nessa lógica,
tornam-se mais sutis os critérios classificatórios.
Podemos valorizar as diferenças que apresentam
os dois jogos sem, no entanto, ignorar o que
tem em comum. A caracterização
da interface corresponde a um fator que se confundiu
com a história da criação
dos gêneros dos jogos. Hoje, um jogo possuiu
em sua história uma série de interfaces
que não podem mais serem consideradas
o critério que define a afiliação
tipológica do jogo. Tomemos um exemplo.
No jogo GTA, existem uma série de interfaces
contextuais, que são executadas à
necessidade que a história se desenrola,
visando engajar seu leitor. Existem corridas,
tiroteios, enigmas entre outros, porém
o gênero comercialmente proposto não
é de maneira alguma a individualidade
das interfaces. Talvez a forma mais aproximada
de caracterizá-lo seja reconhecê-lo
como afiliado de um gênero cinematográfico:
o policial.
A partir reposicionamento
dos conceitos derivados tanto da narratologia
como da ludologia, cercam-se muitos dos problemas
tipológicos dos games. Existe,
entretanto, um terceiro fator que atravessa os
dois primeiros. O estatuto tecnológico.
O estatuto tecnológico
Por ser uma dimensão que não é
apresentada sob nenhum aspecto nas dimensões
anteriores, trataremos dele com um pouco mais
de atenção.
O conceito de
estatuto tecnológico não pode ser
considerado uma novidade no estudo dos games
uma vez que é a principal preocupação
das ciências da informática no que
diz respeito aos jogos. No entanto, no que diz
respeito à comunicação,
a tecnologia nos games parece ser uma
ilustre desconhecida. É curioso pensar
que até mesmo dentro das grandes discussões
e tomadas de posição em relação
ao papel que as tecnologias desempenham nos processos
midiáticos, não é comum
que se pense os games em termos de sua tecnologia.
Nesse aspecto, os estudos sobre eles no campo
da comunicação são inexpressivos.
Se no cinema as tecnologias digitais chamam cada
vez mais atenção no que se refere
ao desempenho de um papel como agente transformador
da narrativa fílmica, nos games
-mídia
que nasce dentro dos nichos sagrados da tecnologia
(engenharia, informática), e que está
indissociavelmente vinculado a elas-, elas parecem
não gerar inquietações ou
sequer a desconfiança de que ali existe
algo que pode nos ajudar a compreender as relações
tecnológicas dentro dos produtos midiáticos
e de sua narrativa.
A raiz dos problemas
da análise das narrativas dos games
parece residir no fato de que este nasce e se
desenvolve a partir de um diálogo com
a tecnologia que é singular dentro dos
meios de comunicação de massa.
Ora, sabemos que a expressão “diálogo
com a tecnologia” bem pode ser aplicada
a qualquer meio. Mas se falamos ‘singular’
queremos dizer que o estatuto tecnológico
dentro dos games é estruturalmente diferente
dos outros meios. No caso do cinema, da tv, do
jornal, rádio e outros (à exceção,
talvez, da Internet), a criação
e desenvolvimento de produtos se utilizam de
tecnologias mais ou menos estáveis: sim,
um roteirista de tv ou cinema trabalha sua narrativa
pensando todo o tempo na sua possibilidade de
realização técnica, mas
essas possibilidades - embora apresentem constantes
aperfeiçoamentos - são relativamente
duradouras, criando padrões e soluções
narrativas cuja existência no tempo se
faz mais marcada. Apesar das melhorias técnicas
nos aparelhos de tv ou nas filmadoras, as narrativas
não apresentam mudanças drásticas.
Mesmo agora, quando se fala muito em uma HDTV
que exige um reciclamento completo do sistema
produtivo das tvs –novo processo de captação,
iluminação, enquadramento, maquiagem,
etc-, podemos pensar se de fato essas melhorias
técnicas exercerão um papel importante
nas escolhas narrativas. Na tv uma nova geração
de aparelhos não condiciona, necessariamente,
modificações das histórias
que conta. Nos games, por outro lado, uma nova
geração de consoles ou softwares
desenvolvedores pode expandir radicalmente as
possibilidades narrativas de seus discursos.
É o fato tecnológico sentando à
mesa de criação. Desconsiderá-lo
ou relegá-lo a simples coadjuvante técnico
é desconsiderar a natureza da produção
dos games. Se no cinema um novo sistema de captação
e reprodução do som não
afeta necessária ou significativamente
o roteiro, é bem possível que nos
games esse fato vá além da simples
feature, mas seja aproveitado dentro
da história como fator estruturante da
narrativa, proporcionando ao jogador puzzles
construídos a partir das peculiaridades
da nova tecnologia.
Em outras palavras,
o estatuto tecnológico diz respeito às
possibilidades de realização técnica
de determinado game. Inúmeras
são as formas pelas quais essas possibilidades
se manifestam dentro do ambiente de jogo. Cada
incremento tecnológico, seja de hardware
seja de software, estabelece o que é
possível dentro de determinada plataforma
de jogo. Por outro lado, age como um sistema
de restrições, impondo aos roteiristas,
designers e programadores rígidos limites
com os quais sua narrativa terá de negociar.
Um exemplo evidente da atuação
da tecnologia sobre a narrativa são os
acréscimos técnicos que cada nova
geração de vídeo-games
(hardware) trás. Alguns
desses acréscimos manifestam-se através
de uma maior capacidade de processamento, portabilidade,
conectividade e interface. Isso se traduz em
refinamento de gráficos (o que por si
só abre um universo de possibilidades
ao roteirista); no acréscimo do número
de NPCs dentro do ambiente; no aumento
do número de variáveis para cada
personagem; no número de jogadores em
um mesmo ambiente de rede; no uso de novos dispositivos
de interação (óculos, joysticks
3d, todo o tipo de sensores para captura de movimento,
etc). Pode-se argumentar que essas modificações
de hardware tem pouca relação com
as histórias que estão sendo contadas:
que um shooter de guerra continuará
sendo um shooter de guerra com ou sem
head sets. Sem dúvida. Mas o
fato do gamer usar uma tecnologia diferente
pode afetar completamente a maneira pela qual
ele joga um game, alterando assim sua
narrativa e introduzindo mais uma variável
na hora de se pensar e desenvolver o jogo. De
fato, podemos rastrear facilmente os impactos
que o aumento de processamento introduz nos games:
jogos que lidam com milhares de personagens,
em uma “arquitetura aberta” - jogo
onde o gamer pode “fazer o que
quiser”. Exemplos de como os dispositivos
técnicos afetam a história e a
experiência de jogo.
Considerações
finais
Propomos
uma metodologia para o estabelecimento de uma
tipologia dos games que se dê a partir
da narrativa. Contextualizando o momento das
pesquisas acadêmicas que tem como objeto
os games enquanto proponentes de sentido, optamos
pela linha apontada por Frasca no sentido de
relacionar ludólogos e narratólogos.
Diferente dele, entretanto, consideramos que
a simples tensão entre narratologia e
ludologia não é o suficiente para
dar conta de aspectos que são próprios
dos games e que atuam de maneira evidente sobre
as narrativas: a importância da dimensão
tecnológica. Propomos, então, que
a narrativa dos games é composta por três
diferentes dimensões: gênero narrativo,
interface e tecnológica.
Essa estruturação
trás a vantagem de articular narratologia
e ludologia -dois pontos de vista que trazem
muita riqueza às discussões sobre
games-, buscando superar uma dicotomia
que tem se colocado historicamente como uma linha
divisória metodológica que impede
pontos de contato entre as abordagens. Pontos
que forneceriam condições de estruturar
reflexões mais complexas sobre os games.
Por outro lado, articula essas duas dimensões
com uma terceira, que é diz respeito à
base tecnológica sobre a qual se constroem
os games e que vai atuar ali de maneira
fundamental na articulação entre
gênero narrativo e interface.
As conclusões
obtidas até aqui apontam a necessidade
da aplicação analítica dessa
estrutura dentro dos games e da verificação,
em profundidade, de como se dão, de fato,
os relacionamentos entre essas três dimensões.
Esse movimento possibilitará apontar os
elementos que as formam e seus modos de operação.
Dentro do grupo de pesquisa de games,
esse esforço representa o próximo
passo no desenvolvimento de uma metodologia de
análise dos games enquanto objeto
midiático.
A estrutura
proposta fundamenta-se na tentativa de tornar
claro o game como produto pertencente
ao campo da comunicação. No entanto,
no que diz respeito a uma possível teoria
dos games, estes aspectos de análise
não se esgotam e nem são desconectados
de outros aspectos constituintes da mídia.
O que diz respeito, por exemplo, aos sentidos
decorrentes da forma de apreciação
e apropriação da narrativa pelo
seu usuário e de suas condições
de recepção. Outra que diz respeito
aos aspectos de produção do produto:
sua processualidade, sua inserção
dentro de uma indústria e do papel que
ocupa dentro do mercado do entretenimento. Temos
consciência de que atuamos dentro do produto
propriamente e das marcas que, de um jeito ou
de outro, aparecem em seus discursos. Temos consciência
de que os aspectos que envolvem a experiência
do jogo são de diversas naturezas. Analisar
um jogo é apenas uma das etapas que envolvem
o estudo do game como elemento midiático.
Mesmo no que
diz respeito à narrativa, uma série
de questões se coloca. Uma delas herdada
das teorias narrativas, mas reconfigurada nos
discursos dos games: como distinguir
o que é texto e o que não é?
Os games atualizam a questão
através de suas marcas tecnológicas
e de interface. Que papel desempenha uma conversa
sobre política ou sexo entre dois jogadores,
dentro de um MMO de fantasia? Como afeta o jogo
a quantidade de informações “extra-jogo”
necessária para o bom desempenho de uma
partida (manuais oficiais ou não, blogs,
walktroughs, fóruns, listas de
discussão).
Notas:
*
Artigo apresentado no Seminário Internacional
da PUCRS e publicado na revista Sessões
do Imaginário edição 14,
encontra-se disponível na web no endereço:
(http://www.pucrs.br/famecos/pos/sessoes/s14/
sessoes14_cristianopinheiro_marsalbranco.pdf)
1 Adventure
game lançado em 1990 pela Lucas Arts e
dirigido por Ron Gilbert. Conta a história
de Guybrush Threepwood, um jovem que quer se
tornar pirata. O quarto e (até então)
último episódio foi lançado
em 2001.
Puzzle: termo usado em game-designer para nomear
dispositivos que desencadeiam avanços
no plot.
Referencias:
CAILLOIS,
Roger. Os jogos e os homens. Lisboa:
Cotovia, 1990.
DEMARIA, Russel & WILSON, Johnny I. High
Score! The Ilustrated History of Electronic Games.
California: McGraw Hill/Osborn, 2004.
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Helsinki: Parnasso #b3, 1999.
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elemento da cultura. São Paulo: Perspectiva,
1971.
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Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001.
JOHNSON, Steven. Everything Bad is Good for
You. How Today´s Popular Culture is Actually
Makins Us Smarter. New York: Riverhead Books,
2005.
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Looking for a Heart of Gameness. Utrecht: (http://www.jesperjuul.net/text/gameplayerworld),
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Marsal Alves Branco
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Ms. Cristiano Max Pereira Pinheiro
Feevale, RS. Brasil. |