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Abril - Mayo 2003

 

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Considerações Semióticas sobre a Natureza da Informação Webjornalística
 

Por Geane Alzamora
Número 32

Webjornalismo/Semiótica/Informação
Introdução
Como ambiente simultâneo de produção e difusão de informações, a Internet mescla processos informativos típicos da comunicação de massa e formas comunicativas bastante contemporâneas, como sinalizam webzines, weblogs e comunidades virtuais que se proliferam na rede.
Embora boa parte das experiências comunicativas observadas em sites jornalísticos não se diferencie muito dos modos comunicativos processados nos suportes que lhe são referenciais (ver, por exemplo, <http://www.lemond.fr/>, <http://www.estado.estadao.com.br/>, http://oglobo.globo.com/> ), a Internet coloca em trânsito processos de produção/difusão de informações jornalísticas razoavelmente inovadores.

Por exemplo, é possível receber todos os dias, gratuitamente e por e-mail, The New York Times on The Web <http://www.nytimes.com>, através de um programa que rastreia se o destinatário acessa regularmente o webjornal. Já sites como <http://www.webfind.com.br/>prestam gratuitamente serviços de clipping presonalizados.

Por outro lado, webzines, weblogs e comunidades virtuais ignoram técnicas de informação jornalísticas forjadas no âmbito da comunicação de massa e inauguram modos irreverentes de se produzir e difundir informações na rede. Em sintonia com recursos de linguagem típicos do meio, tais como interatividade, multimidialidade, hipertextualidade e memória (sobre o assunto ver Lèvy, 1994), essas novas formas de comunicação trazem questões instigantes para a noção de Jornalismo como transmissão generalizada de informações mediadas por profissionais da área.

Numa época na qual nem se pensava ainda em Internet, José Luís Martínez Alberto (1977, pag. 23) afirmava que "Redación Periodística es la ciencia que se ocupa del estudio de unos determinados signos - naturales y técnicos - ordenados en una unidade de pensamiento com el fin de transmitir dados e ideas de interés general através del periódico o de cuaquier outro medio de comunicación de masas".

As experiências jornalísticas na Internet que derivam de veículos de comunicação de massa, de modo geral, corroboram ainda essa idéia. Porém, novas formas comunicativas que se insinuam na rede colocam a informação em trânsito de outro modo: em processos de mediação descentralizados, modelados por interesses específicos de cada comunidade virtual. Nessas situações, a informação não é generalizada nem transmitida por um emissor privilegiado, mas modelada por um conjunto flexível de participantes agenciados em torno de interesses comuns manifestos por uma certa comunidade virtual.

Vários autores discutem essa questões (ver, por exemplo, Moura, 2002, Canavilhas, 2003, Antoun, 2001), relativizando conceitos e valores sobre os quais se solidificou a idéia de informação jornalística. Experiências como <http://www.slashdot.org/> e <http://www.indymedia.org/> , por exemplo, estruturam-se a partir da noção de comunidade virtual. Exatamente por isso, as informações derivam de processos de mediação descentralizados que refutam valores consagrados pelo Jornalismo tradicional, como objetividade e imparcialidade.

A profusão contemporânea de quantidade e qualidade de informação na Internet, portanto, redefine lugares de busca de informação e, conseqüentemente, problematiza o papel dos filtros informativos, até então predominantemente sob responsabilidade de jornalistas legitimados socialmente pelos meios de comunicação de massa. Segundo Rheingold (1996, pag. 78), "as comunidades virtuais podem auxiliar os respectivos membros a lidar com a sobrecarga de informação, independente de serem profissionais ligados à informação".

Para se discutir essas questões, opta-se aqui por problematizar inicialmente a natureza da informação jornalística para, posteriormente, localizar a questão no âmbito da Internet. Sugere-se que informação em webjornalismo é menos um problema de técnica jornalística que uma discussão conceitual do meio, que privilegie aspectos teóricos plurais, híbridos, transdisciplinares.

Nessa perspectiva, opta-se pela abordagem peirceana da questão. Entende-se aqui que a natureza natureza plural, híbrida e transdisciplinar da semiótica peirceana revela-se particularmente adequada para se pensar a natureza igualmente híbrida, impura e transdisciplinar da informação em webjornalismo.

Aspectos Semióticos
Complexo e muito abstrato, o pensamento de Charles Sanders Peirce (1839-1914) alicerça-se sobre três categorias fenomenológicas capazes de englobar tudo o que é, tudo o que pode ser e tudo o que tende a ser. As três categorias são onipresentes nos fenômenos, ou seja, "tudo o que aparece à mente, seja real ou não" (Peirce, 1983, pag. 85).
Na primeira categoria (primeiridade), o fenômeno não passa de uma mera possibilidade ainda não atualizada, vaga, múltipla, indiferenciada. Ao se atualizar parcialmente em um existente qualquer, as qualidades características da primeiridade se particularizam, estabelecendo uma relação dicotômica entre dois campos fenomenológicos, estágio denominado secundidade por Peirce. A terceiridade é um outro campo fenomenológico, que estabelece a mediação entre a primeirdade e a secundidade, de modo a tornar inteligível (terceiridade) a atualização (secundidade) do possível (primeiridade). A terceiridade estabelece um propósito para a ação, que se processa na secundidade a partir de fundamentos qualitativos da primeiridade. Desse modo, as categorias são onipresentes no fenômeno, embora seja observável o predomínio de uma ou outra. A primeira categoria prescinde da segunda, que prescinde da terceira. Esta contém a segunda, que contém a primeira. Ao mesmo tempo, a terceiridade é o propósito da secundidade e a mediação entre esta e a primeiridade.

As três categorais encontram ressonância na noção peirceana de signo, segundo a qual "signo é aquilo que sob certo aspecto ou modo representa algo para alguém" (Peirce, 1990, pag. 46). O signo peirceano constrói-se triadicamente, a partir de domínios fenomenológicos, ou seja, é algo que atualiza (secundidade) parcialmente um campo de possíveis (primeridade), que é, por sua vez, um signo anterior que determina parcialmente um signo segundo com o propósito (terceiridade) de criar, em uma mente qualquer, um terceiro signo, equivalente ao primeiro e talvez mais desenvolvido, denominado interpretante. A noção de signo em Peirce, portanto, refere-se à noção de mediação, ou seja, de semiose - a ação natural de o signo transformar-se infinitamente em outro. Esse processo, para Peirce, é sinônimo de inteligência e de mente. O que a Semiótica estuda, portanto, é menos o signo que a semiose, tendo em vista que o signo peirceano é processual, de natureza incompleta e progressiva.

O signo estabelece relações consigo mesmo, com seu objeto e com seu interpretante. Para os propósitos deste artigo, vamos trabalhar somente a primeira relação, do signo com seu objeto. Nesta, o signo pode se referir ao objeto em nível de primeiridade (ícone), de modo análogo, metafórico ou sinestésico. Quando o signo é uma extensão física desse objeto, estabelece uma relação de secundidade (índice). Ao representar o objeto, de modo arbitrário, por força de uma convenção social, o signo é um símbolo (terceiridade).

Para os propósitos deste artigo, essas definições são suficientes.

A informação como categoria fenomenológica
Na perspectiva deste trabalho, informação jornalística deve ser entendida como processo sígnico que busca produzir na mente (semiose) um interpretante, que é um signo similar ao objeto que lhe serve de referência . Nessa relação, o acontecimento ocupa o lugar lógico do objeto e o fato jornalístico ocupa o lugar lógico do signo na semiose jornalística. Como se constitui semioticamente o fato webjornalístico será discutido mais à frente neste artigo.

Antes, porém, faz-se necessário evidenciar a natureza complexa da informação jornalística como articulação de três níveis fenomenológicos engendráveis segundo a lógica das categorias peirceanas. A proposta relativiza a independência dos gêneros Informativo, Interpretativo e Opinativo (sobre o assunto ver Melo, 1994), sugerindo uma constante relação entre eles. Os três gêneros, portanto, passam a ser vistos como complementares e não excludentes.

Nessa abordagem, a interpretação ocuparia o lugar lógico da primeiridade por promover uma tradução subjetiva do fato, conduzindo uma leitura possível do objeto (acontecimento) que lhe serve de referência, de modo analógo, sinestésico ou metafórico. A informação ocuparia o lugar lógico da secundidade por contextualizar o fato através de "provas", referindo-se indicialmente ao acontecimento em pauta. Já a opinião ocuparia o lugar lógico da terceiridade por promover uma representação simbólica do objeto (acontecimento) com o propósito de formar juízos de gosto e valor em torno do signo (fato).

Tem-se, então, que a informação deriva de um processo de interpretação, no qual estão incluídos juízos prévios de gosto e valor. Desse modo, a informação particulariza em fato jornalístico uma possível interpretação do acontecimento, tendo por propósito se traduzir em um juízo coletivo através de um argumento opinativo.

Uma vez que a terceiridade engloba a secundidade e esta a primeiridade, pode-se concluir que a opinião contém a informação e esta, por sua vez, singulariza um modo possível de interpretar o objeto. E como a terceiridade simultaneamente faz a mediação entre a primeiridade e a secundidade, juízos de gosto e valor (opinião) se interpõem entre o modo como o acontecimento foi interpretado em fato jornalístico e a seleção de informações que o contextualizará para o leitor. Assim, a opinião surge de um progressivo edifício argumentativo que permeia o processo informativo.

O texto jornalístico, nessa perspectiva teórica, pode ser entendido como a tradução desses três níveis fenomenológicos articulados. Os recursos de linguagem da Internet parecem particularmente apropriados para tal proposta, uma vez que, pelo hipertexto, torna-se possível engendrar os três níveis no mesmo texto.

Por exemplo, tem-se em primeiro plano o nível informativo, uma vez que a secundidade é o nível fenomenológico através do qual o signo surge na semiose. Em segundo plano, penetra-se nos níveis interpretativo e/ou opinativo da informação, em uma espécie de condensação do texto jornalístico (sobre condensação como propriedade do hipertexto ver Johnson, 2001). Pelo hipertexto, então, torna-se possível produzir uma informação simultaneamente mais sintética e mais complexa.

A informação, ofato eo ciberespaço
Discutir a natureza da informação em webjornalismo demanda que se explicite como a informação atravessa a relação fato/acontecimento, a dimensão semiótica desta e o que caracteriza a noção de realidade - substrato da relação fato/acontecimento - que emerge do ciberespaço.

Nesse sentido, sugere-se considerar o webjornalismo como organização de informações produzidas/difundidas no ciberespaço, conforme interesses da linha editorial do webjornal e/ou da comunidade virtual a qual este se vincula. Webjornalismo, portanto, é algo diverso e multifacetado, cujas manifestações diferenciadas têm em comum a condição de se processarem no domínio da ciberespaço - ambiente de trocas de informações alicerçadas na relação homem-máquina-homem.

É no ciberespaço que se processam as relações sócio-culturais na rede, às quais se vinculam processos comunicativos singulares. Portanto, o ciberespaço torna-se palco de experiências singulares, que modelam uma outra noção de realidade. A natureza do ciberespaço tem sido bastante discutida por diversos autores em todo o mundo (ver, por exemplo, Lévy, 1999 e Lemos, 2002). Neste artigo, propõe-se uma abordagem peirceana da questão.

Por ser no ciberespaço que os acontecimentos da rede se processam e a noção de realidade se expande, propõe-se discutir a natureza semiótica do ciberespaço a partir da noção de realidade em Peirce. Para a semiótica peirceana, a noção de realidade refere-se à articulação das três categorias fenomenológicas. Segundo Potter


The three fundamental categories of Peirce are: the possible, the actual, and the destined - may-be's, are's , and would-be's (...) The third category is properly that of thought, regularity, law-likeness, ando so is most necessary and sufficient to account for the complexity of the real. (Potter, 1996, pag. 99)

A realidade, portanto, pode ser entendida como um processo que inclui o que é, o que pode ser e o que dever ser. A terceiridade fornece parâmetros para se compreender a complexidade da realidade, mas é na secundidade que se processam as experiências sócio-culturais, os acontecimentos - substratos da realidade. Acontecimentos particularizam possibilidades infinitas de ocorrências (primeiridade), mediante normas de linguagem e conforme alguns propósitos (terceiridade).

A categoria da existência, na qual se processam as experiências, os acontecimentos, é modelada, segundo Peirce (citado por Potter, 1996) por interações espaço-temporais. Estas participam dos modos como a informação circula através dos meios de comunicação.

No ciberespaço, as relações espaço-temporais são diferentes daquelas modeladas pelos meios tradicionais de comunicação de massa. Em vez do espaço restrito dos jornais e revistas impressos, tem-se, no ciberespaço, o espaço virtual da rede, potencialmente expandido no webjornal pelo hipertexto; em vez do tempo não renovável dos telejornais e radiojornais, tem-se o tempo da atualização constante do webjornal, expandido pelo espaço sobressalente de informações permanentemente disponíveis pela memória.

O ciberespaço, portanto, altera as relações espaço-temporais consagradas pelos meios de comunicação de massa e, desse modo, modela novas experiências sócio-comunicativas que alicerçam uma noção bastante contemporânea de realidade.

Potter esclarece que experiência

Is a conscious effect produced upon a subject by brute interaction with the environment such that it contributes to the formation of habits (...) All knowledge, Peirce holds, is based on direct experience (...) Furthemore, the real and the knowable are co-extensive" (Potter, 1996, pag. 172).

Sendo o ciberespaço potencialmente infinito, recorta-se como 'realidade' no ciberespaço aquilo que é passível de ser conhecido. Como 'veículo de conhecimento', a informação coloca em trânsito na rede concepções de realidade que emergem do ciberespaço.

Torna-se necessário, então, que se formem novos hábitos culturais em torno das relações espaço-temporais da rede e que estes se traduzam em propostas comunicativas singulares, compatíveis com as noções alteradas de realidade, experiência, cultura e sociedade.

Nessa perspectiva, propõe-se que a realidade modelada pelo ciberespaço refira-se à apreensão cultural das experiências sócio-comunicativas processadas na rede. Esse tipo de experiência tende a se traduzir em hábitos de trafegar pelo ciberespaço e suas respectivas comunidades virtuais.
Esse é um dos desafios impostos às informações webjornalísticas. Ao articular no hipertexto webjornalístico interpretação, informação e opinião, tais informações contribuem para difundir uma certa noção de realidade na contemporaneidade, na medida em que servem de 'guia' para exploração do ciberespaço.

É preciso lembrar, porém, que as experiências que se processam na rede guardam referências sígnicas em experiências que se processam fora da rede. Desse modo, a dimensão híbrida do meio estende-se para além dos domínios deste, uma vez que o meio - o ciberespaço - é o lugar no qual se processam experiências de referências múltiplas, portanto, de natureza híbrida.

A informação webjornalística, nessa perspectiva, seria o modo como se torna possível apreender tais experiências a partir de determinados interesses comunicativos. Assim, ao mesmo tempo que se volta para as experiências que se processam no ciberespaço, a informação webjornalística simultaneamente toma por referências experiências que se processam fora dele. Esse hibridismo parece corresponder à noção contemporânea de realidade.

O fato webjornalístico, então, teria uma referência múltipla, uma vez que os acontecimentos que lhe servem de referência se processam simultaneamente no ciberespaço e fora dele. Assim, a informação webjornalística precisa articular em linguagem ambas as experiências. Não se trata, portanto, nem de linguagem jornalística tradicional, nem de mero manuseio de recursos de linguagem do meio, mas de algo híbrido, plural, multifacetado.

Uma análise superficial da maior parte dos chamados webjornais, porém, revela que o interesse deles volta-se prioritariamente para fora da rede, ignorando, na maior parte das vezes, boa parte dos recursos de linguagem que delineiam o meio e, conseqüentemente, as experiências sócio/culturais ambientadas no ciberespaço (sobre recursos de linguagem do meio usados em webjornais brasileiros, ver <http://www.facom.ufba.br/panopticon>) .

Tais experiências, ao se tornarem objeto de interesse jornalístico, tornam-se fatos. Estes são espécies de representações de acontecimentos, ou seja, o fato seria algo como os acontecimentos, ou ocorrências que resultam das experiências, traduzidas em linguagem - no caso, em linguagem webjornalística.

A world is a deneated by a system of facts, but facts are not independent of the selective knowledge process, for facts are abstracted portions of a continnum of events. (Rosenthal, 1994, pag. 8).


Não por acaso, dizemos fatos jornalísticos, expressão que determina significações específicas aos acontecimentos. Os fatos relacionam-se de modo indicial aos acontecimentos e se misturam a estes pela experiência. Se pensarmos a informação webjornalística como um processo sígnico que tem por propósito difundir uma certa concepção de realidade, teremos o fato como um recorte estabelecido no campo do real que se refere à significação indicial do acontecimento, uma espécie de semiose que atravessa o acontecimento, manifesta-se no discurso jornalístico e traduz-se em uma nova representação na mente de quem processa essa experiência sígnica.

Como o índice é uma extensão física do objeto no signo, fatos webjornalísticos derivados de acontecimentos no ciberespaço podem se traduzir em informações indiciais, ou seja, extensões hipertextuais de tais acontecimentos que se mesclam ao texto webjornalístico. Isso se torna possível porque os acontecimentos dos ciberespaço são passíveis de serem "guardados" (propriedade de memória) e "engendrados" (propriedade de hipertextualidade).

A situação é singular para o Jornalismo, uma vez que os meios de comunicação de massa representam acontecimentos exteriores ao veículo e, na Internet, acontecimentos do ciberespaço e fatos webjornalísticos encontram-se no mesmo ambiente. Conseqüentemente, torna-se possível, através do hipertexto jornalístico, conectar indicialmente fatos a acontecimentos de modo inovador, reconfigurando técnicas e convicções.

Essa é uma possibilidade ainda pouco explorada no texto webjornalístico que, de modo geral, limita-se a fornecer o link da ocorrência em pauta, sem consideráveis alterações semióticas na composição do texto webjornalístico. Na perspectiva de uma alteração semiótica significativa, fato webjornalístico e acontecimento do ciberespaço traduziriam-se, possivelmente, em um hipertexto híbrido, que traria à tona do texto jornalístico aspectos semióticos do acontecimento em pauta, tais como recursos de linguagem, conceitos e formatos.

Mas se o fato webjornalístico, conforme já foi aqui mencionado, mescla acontecimentos que se processam simultaneamente na rede e fora dela, não há fatos exclusivos do ciberespaço, já que as experiências sócio-culturais do ciberespaço se originam fora dele. Daí a necessidade de se pensar a informação webjornalística como articulação de referências múltiplas, portanto, de natureza complexa e híbrida. Em que medida isso implica em revisão do campo epstemológico do Jornalismo ainda é uma incógnita.

Outro ponto que complexifica a natureza da informação webjornalística é o uso cada vez mais complexo do canal em hipermídia, que tende cada vez mais a apresentar autonomia semiótica e a participar do processo de produção/difusão da informação. Nota-se que o canal em hipermídia já assume eventualmente níveis rudimentares de emissão, recepção, produzindo informações relativamente próprias. "Embora computadores sejam uma espécie de máquina, eles respondem de uma maneira que é mais que mecânica. São uma espécie de "outro", se não são totalmente um "eu"". (Lyman, 1997, pag. 120)

Para Johnson (2002) os recursos de linguagem da Internet tendem a alterar o uso tradicional da informação na rede. O autor argumenta que o aperfeiçoamento de alguns softwares, conhecidos como agentes, e usos mais adequados de recursos como links, podem contribuir para a formação de um novo paradigma comunicacional.

(...) um agente que fosse capaz de avaliar nossos gostos em matéria de cinema ou de vinhos, ou até de pessoas, que fosse capaz de construir um modelo nuançado da nossa sensibilidade estética ou interpessoal - essa seria uma mudança de paradigma digna desse nome. (Johnson, 2001, pag. 140)

Níveis semióticos da informação
A experiência, que incorpora o acontecimento ao fato e este à semiose jornalística, se expressa através de manifestações diferenciadas de níveis informativos, veiculando concepções acerca da realidade contemporânea. É possível que a informação processe-se sob diferentes predomínios fenomenológicos para representar a semiose proposta: icônico (referência análoga, metafórica ou sinestésica), indicial (conexão física) ou simbólico (juízos de gosto e valor).

É certo que em webjornalismo os três níveis informativos demandam intensa investigação acerca de suas possíveis articulações semióticas, uma vez que fatos webjornalísticos são híbridos e complexos, tendo por referência acontecimentos processados no ciberespaço e fora dele. Desse modo, torna-se relevante compreender em que medida os fatos webjornalísticos representam os acontecimentos (a exemplo da comunicação de massa, domínio da terceiridade) e em que medida simulam (recriação criativa, domínio da primeiridade) ou atestam (conexão física, domínio da secundidade) tais acontecimentos.

Em qualquer das situações, parece bastante provável que a informação webjornalística tenda a se utilizar dos próprios recursos de linguagem do meio para produzir informações híbridas em um hipertexto informativo cada vez mais sintético e semioticamente complexo. Isso parece possível na medida em que o meio permite lançar mão de recursos de linguagem simultâneos que reforcem os domínios fenomenológicos pretendidos para cada tipo de informação. Por exemplo, recursos visuais para enfatizar domínios indiciais do texto jornalístico, recursos sonoros para enfatizar domínios icônicos e recursos verbais para enfatizar domínios simbólicos (sobre o assunto, ver Santaella, 1989 e Santaella, 2001).

Nessa perspectiva, aspectos sonoros da informação webjornalística teriam predominância icônica e, desse modo, deveriam privilegiar, potencialmente, uma apreensão sinestésica do fato. Aspectos visuais da informação webjornalística apresentariam domínio indicial, na medida em que deveriam referir-se ao fato por força de uma extensão física - a própria imagem deste no signo ou o link, por exemplo. E aspectos verbais da informação webjornalística apresentariam domínio simbólico por privilegiar um tipo de texto que representa o acontecimento - seu objeto - por força de uma convenção social: o próprio verbo.

Segundo Peirce (citado por Jakobson, 1973, pag. 104), "os mais perfeitos dos signos são aqueles nos quais o caráter icônico, indicial e simbólico estejam amalgamados em proporções tão iguais quanto possíveis". Propõe-se, então, o webjornalismo como arena na qual os domínios fenomenógicos discutidos aqui na perspetiva de gêneros e de linguagem, se engendrem de modo tão amalgamado quanto possível. Propicia-se, assim, uma modalidade jornalística tão mais híbrida quanto possível, ao mesmo tempo em que fornece-se subsídios para que se potencialize domínios semióticos adequados a cada intenção comunicativa. Com isso, evidencia-se a complexidade do processo informativo em webjornalismo.

Uma vez que as informações são semioticamente complexas e diversas, torna-se possível, em webjornalismo, lançar mão dos próprios recursos de linguagem do meio para privilegiar níveis fenomenológicos da informação, considerados prioritários em cada situação comunicativa.

Propõe-se, portanto, entender a informação como grandeza que atravessa o fluxo semiótico em três níveis fenomenológicos: simultaneamente, a informação apresentaria níveis qualitativo (icônico), contextual (indicial) e convencional (simbólico), podendo ainda priorizar um ou outro domínio segundo o modo como se pretende representar o acontecimento em fato webjornalístico.

A proposta refuta a noção difundida pela Teoria da Informação segundo a qual a comunicação é transmissão de informação de uma fonte a um receptor, mediante o uso de um canal. Essa teoria, que fundamentou diversas abordagens da comunicação de massa, utiliza recursos conceituais como probabilidade e entropia, relacionados a redundância e novidade, para mensurar a quantidade de informação transmitida no sistema (sobre o assunto ver Alsina, 1989, e Mattelart, 2000).

Mesmo no âmbito da comunicação de massa, a idéia de quantidade como parâmetro de informação foi questionada. "Este realce do valor quantitativo de uma mensagem é inteiramente constestável; sempre se imporá, para o analista da informação social (...) o problema do significado da mensagem. (Coelho Netto, 1973, pag. 20)

Mais recentemente, Armand Mattleart retoma crítica similar. "Com a Teoria Matemática da Comunicação fica completamente esquecida a questão do sentido e, além disso, da cultura, pois aí não há qualquer interrogação sobre a cultura. (Mattelart, 2000, pag. 08)

No que se refere à informação processada na Internet, o problema do "sentido esquecido" cresce exponencialmente, uma vez que o contexto de emissão, recepção e produção/difusão da informação é outro. Nesse contexto, interessa menos saber a quantidade que a qualidade desta para o recpetor-usuário, que eventualmente se torna co-autor da informação. Desse modo, novidade passa a ser um valor relativo, uma vez que cada comunidade virtual tem autonomia para considerar se é mais relevante uma informação nova que a discussão aprofundada de uma informação já conhecida.

Na perspectiva deste trabalho, informação, em webjornalismo, não se relaciona nem a quantidade, nem a transmissão, mas a fluxos semióticos qualitativamente distintos, engendráveis, hibridizáveis e modeláveis cada vez mais por agenciamentos coletivos na rede. Não haveria, nessa perspectiva teórica, discurso informativo isento de interpretação e de propósitos opinativos, nem informação jornalística desprovida de parcialidade e subjetividade. Não haveria sequer distinção rigorosa entre informação jornalística e não jornalística na rede, um vez que qualquer informação de interesse jornalístico na rede pode se conectar hipertextualmente ao webjornal, numa espécie de engendramento semiótico de informações de natureza dessemelhantes que concorrem para difundir uma certa concepção da realidade contemporânea.

CONCLUSÃO
O webjornalismo encontra-se em estágio de grande indefinição paradigmática, não apenas devido ao momento inicial de construção da linguagem, no qual tradicionalmente busca-se referências conceituais anteriores, como também devido à diversidade de propostas peculiares que colocam em trânsito a informação na rede, de modo jornalístico ou não.

Um modo possível de superar essas limitações, segundo hipótese levantada por este artigo, seria rever o conceito de informação, tanto no que se refere a gênero jornalístico, quanto no que se refere ao entendimento de informação como novidade, noção assentada em um valor que relaciona informação à quantidade de novidades introduzidas no sistema. A partir da semiótica peirceana, propõe-se a onipresença dos gêneros jornalísticos - Informativo, Interpretativo e Opinativo - segundo a lógica de relação das categorias fenomenológicas de Charles Sanders Peirce.

Também na perspectiva da semiótica peirceana, sugere-se entender a informação não meramente como novidade, mas como articulação dos três níveis fenomenológicos. Desse modo, a informação é qualitativa (icônico), contextual (indicial) e convencional (simbólico), podendo-se priorizar um ou outro domínio segundo o modo como se pretende relacionar fato e ocorrência no hipertexto jornalístico.

Pensando o webjornalismo como articulação de linguagens processadas em domínios semióticos distintos, sugere-se que recursos de linguagem sonoros privilegiem a dimensão icônica, visuais relacionem-se predominantemente ao índice e verbais ao símbolo. Assim, a informação em webjornalismo poderia ainda lançar mão de recursos de linguagem específicos para potencializar determinados níveis fenomenológicos da informação considerados prioritários em cada situação comunicativa, como modo de tornar o hipertexto jornalístico mais sintético, porém semioticamente mais complexo.


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Geane Carvalho Alzamora
PUC-Minas/PUC-SP, Brasil